Parte II – B
O profeta Amós, de Técua, era particularmente crítico para com a região do Norte, embora sendo do Sul, denunciando toda a classe de injustiças sociais do seu tempo. Simultaneamente, anunciava terríveis castigos por causa destes desvios. No primeiro capítulo, o profeta aponta a sua profecia destruidora para sete povos pagãos vizinhos de Israel por injustiças cometidas. Mas, no segundo capítulo aponta o seu foco para Israel, descrevendo uma destruição e punição exemplares pelas faltas cometidas. O capítulo 4 descreve o ‘encontro com Deus’ como algo terrível e de confronto com a realidade criada, que afetará também o ser humano (cf. 4, 6-12).
Em linha paralela, surge Oseias, filho de Beeri, um profeta do Norte que anuncia também tempos de destruição e calamidade. Ao desposar uma mulher de fraca reputação, o profeta assume uma metáfora da relação entre Deus e a Humanidade, cujo relacionamento não é marcado pela harmonia. A queda da Samaria poderia ter sido vista como um acontecimento natural, mas para um homem religioso como Oseias tratou-se de uma consequência da idolatria do Povo e seus governantes. Esta visão do sofrimento como ação punitiva de Deus está presente em todos os profetas escritores. Isaías inicia o seu livro com esta visão, onde o afastamento do ‘Santo de Israel’ traduz-se em consequências desastrosas para o Povo. O abandono de Deus acaba por transformar o Povo em Seu inimigo. No entanto, esta ‘lição destrutiva’ não perdurará para sempre, mas está envolvida em esperança, que se manifestará numa espécie de ‘resto’, que anunciará o fim da ira e um novo recomeço. O próprio Jeremias anuncia catástrofes naturais, como forma de atingir o Povo, que será o verdadeiro castigado ao ver-se privado daquilo que o sustenta. Na leitura deste profeta, o sofrimento vem de Deus, que terminará após o regresso ao culto do Deus único.
Esta perspetiva não ficou limitada aos profetas, mas moldou uma mentalidade que estará presente nos livros históricos, sobretudo em Josué, Juízes, 1 e 2 Samuel e 1 e 2 Reis. Também se encontra na literatura sapiencial de alguns salmos e Provérbios. Os profetas estavam preocupados com os problemas da vida real das pessoas – as injustiças, opressões, miséria. Para despertar as consciências, cada um, ao seu estilo, procurava inquietar para produzir mudanças e transformações. A sua linguagem religiosa leva-os a ligar o sofrimento a Deus, ‘origem’ de muitos males, mas, na verdade, eles procuravam introduzir uma coerência religiosa.
Entre a literatura sapiencial destacamos o livro dos Provérbios, que parece não ter uma organização identificável, mas recolhe um conjunto de ditos sábios, sem fluxo narrativo. Embora diferente, este livro faz eco da mentalidade profética, ligando a felicidade à prática de uma vida correta e o sofrimento a uma vida iníqua: «A maldição do Senhor vai sobre a casa do ímpio, mas Ele abençoa a morada dos justos.» Mesmo no Pentateuco existe uma constante: o pecado é uma desobediência a Deus e produz uma punição. Recordemos que todo o povo saído do Egito foi proibido de entrar na Terra Prometida, entrando apenas duas pessoas: Caleb e Josué. O capítulo 28 do Deuteronómio é a chave para compreender toda a teologia do livro, onde estão descritas as bênçãos e as maldições, consoante a obediência ou desobediência aos Mandamentos do Senhor. (continua…)
P. Virgílio Marques Rodrigues