Só na luz de Deus podemos ser felizes
A beleza espiritual de Santa Beatriz desafia a nossa fé cristã a ser vivida num caminho de bem-aventurança. Ela é feliz porque uma estrela continua a brilhar na sua vida de simplicidade, de humildade, de alegria e de luz, enchendo de beleza a Igreja inteira.
A participação na santidade de Deus é sempre um convite para caminhar na perfeição à luz dos valores humanos e evangélicos. Santa Beatriz foi uma açucena perfumada pela santidade divina, oferecendo a todos o “bom odor” de Cristo.
A Igreja é o campo de Deus onde floresce a santidade e a virtude dos seus membros. Maria, a Imaculada, é a flor mais bela e perfumada do jardim da Igreja universal. O tema da santidade faz sempre algumas perguntas:
O que move um jovem a colocar Deus em primeiro lugar na sua vida? A busca de sentido para a vida? A escolha de um ideal sobrenatural? A resposta ao apelo de Deus no dinamismo da vocação cristã? Afinal, o que me move a ser cristão, religiosa contemplativa? Uma pergunta difícil de responder, mas que tem atualidade pertinente na vida de um jovem, rapaz ou rapariga, que deseje descobrir a vontade de Deus a seu respeito.
- A infância como busca de um projeto de realização pessoal.
Beatriz da Silva Menezes nasceu em 1426, filha de D. Rui Gomes da Silva, valente cavaleiro que participou na tomada de Ceuta e Alcaide de Campo Maior, e de D. Isabel de Menezes, filha do Conde de Vila Real, ilustre descendente de Dom Afonso Henriques, primeiro rei de Portugal. É a oitava filha do nobre casal no seio de uma família católica, onde recebeu esmerada educação nas virtudes cristãs.
A sua vida foi calma e marcada pela inocência até aos 23 anos. Beatriz mostrou sempre qualidades extraordinárias: docilidade, retidão de consciência, inclinação para as virtudes e atração pelas coisas espirituais.
Em 1447, com 23 anos de idade, deixa o ambiente calmo e familiar para acompanhar a princesa Dona Isabel, sua prima de 19 anos, que ia casar-se com Dom João II de Castela, que a convidou para ser sua dama na corte espanhola. Beatriz confiou à Santíssima Virgem a sua vida através deste convite. Embora não estivesse definido o Dogma da Imaculada Conceição, era pelo nome de Imaculada que ela gostava de invocar Nossa Senhora. Nela se inspirava e colocava as suas preocupações de cada dia. Na vida da corte, não pensando em honras e na posição social, preocupava-se tudo fazer para a glória da Mãe de Deus, deixar-se iluminar pela sua luz, pôr em prática o seu ideal de vida e fazer tudo para glorificar a Deus.
- A virtude provada no meio das dificuldades e perigos da corte.
A vida espiritual, vivida onde quer que seja: na família, na paróquia, ou mesmo dentro de um convento de clausura, tem sempre as suas partes positivas e negativas. O fausto luxo e prazer da corte não seduzia Beatriz. Os banquetes, os torneios, as caçadas, o uso de joias, o faustoso vestuário, os ricos palácios que influenciavam a nobreza, não afetaram a vida e a identidade de Beatriz.
Soube afastar-se da ambição, das intrigas e das invejas palacianas. Beatriz tinha uma rara beleza, dignidade e gentileza extraordinárias. A sua grandeza de alma mantinha-a acima de todas as futilidades mundanas e, ao mesmo tempo, fazia-a condescendente e bondosa para com todos, exceto com quem poderia desviá-la do caminho reto. Foi vítima do ciúme e da inveja da sua prima e teve de suportar muitos sacrifícios e maus tratos.
- Deus vem em auxílio dos atribulados e dos que sofrem.
Certa noite, Beatriz, cansada, derramou abundantes lágrimas aos pés de uma imagem de Nossa Senhora e implorou-lhe forças para manter-se fiel naquela dramática situação e poder cumprir o chamamento que sentia no fundo da sua alma.
Depois deste momento, Dona Isabel convida Beatriz a segui-la e aqui começa o seu longo calvário. “Senhora, quereis matar-me, mas sabei que sou inocente das culpas que me imputais”. Deus, justo Juiz, é testemunha do vosso ato. Mas a prima não desistiu e meteu-a dentro do armário-cofre.
- Da dor e no pavor da escuridão, brilha a Imaculada.
A nobre dama viu-se sem qualquer possibilidade de salvação. Beatriz permaneceu três dias no cofre, cheia de consolação e alegria, sem sentir passar o tempo. Sofreu porque não queria morrer sem os sacramentos, sem receber o auxílio de alguém numa agonia lenta e pavorosa. Começava já a sentir a falta de ar, e, com confiança, dirigiu-se a Nossa Senhora, que tudo pode.
“Ó Maria Imaculada, valei-me”! Nesse instante, mais resplandecente que o sol, apareceu-lhe Nossa Senhora vestida de luz e que lhe disse: minha filha não morrerás. “Ao abrir a porta, saiu Beatriz ainda mais bela, reluzente como diamante”. “Beatriz possuía formosura, dignidade e gentileza extraordinárias, mas atraía, sobretudo, pela beleza do seu espírito”.
- A preparação de uma fundação religiosa.
Beatriz deixou a sua ama e retirou-se para o mosteiro de São Domingos, o Real, situado em Toledo, onde viveu durante 30 anos, consciente de “que nunca mais serviria a uma rainha da terra, mas à Rainha do Céu”.
O encontro no caminho da fundação com dois frades franciscanos, que ela identificou com São Francisco e Santo António, foram muito importantes nos alicerces da fundação. O hábito branco e azul símbolo da Imaculada, ajudaram a fazer do silêncio e da contemplação o segredo constante da sua oração.
Em 1484, a Rainha Isabel, a Católica, filha e sucessora daquela que lhe queria tirar a vida, veio pedir orações a Beatriz pelas necessidades políticas do seu reino. No final da conversa, a rainha, agradecida pelo acolhimento, oferece-lhe um palácio junto da Igreja da Santa Fé em Toledo, para iniciar a sua obra tão almejada. Beatriz viu nessa oferta a mão da Divina Providência: era o momento da fundação. Assim nasceu a Ordem das Irmãs Concepcionistas Franciscanas da Imaculada Conceição.
As dificuldades na fundação e na aprovação Pontifícia foram muitas. O naufrágio onde desapareceu a Bula do Papa Inocêncio VIII causou muito sofrimento. Mas o amor inflamado de Santa Beatriz à Imaculada nunca esmorece.
- A confiança na Santíssima Virgem, gera nela a graça do milagre.
Após três dias de intensa oração, a santa madre abriu a gaveta de um móvel, da qual só ela tinha a chave, e deparou-se com um pergaminho enrolado, que ela nunca vira antes. Era a Bula do Papa Inocêncio VIII.
Sentiu um forte cheiro de mar e seu coração estremeceu. “Meu Deus, isto parece a Bula Pontifícia”. Pegou-lhe e percebeu um selo pendente de um fio: desenrolou-o um pouco e pôde ler algumas palavras em latim. Tinha todas as características de uma bula, datada de 30 de abril de 1489. Ficou conhecida como a “Bula do Milagre”, que, segundo Santa Beatriz, deve a São Rafael a graça de a ter recuperado das águas.
A sua morte ocorre quando as religiosas faziam o retiro para a profissão solene dos votos e a receção oficial do hábito. Nesse momento a Virgem Maria apareceu à Santa Fundadora e disse-lhe: “Filha, não é minha vontade, nem de meu Filho, que gozes aqui na terra o que tanto tens desejado. Daqui a dez dias vais comigo ao Paraíso”.
Beatriz caiu enferma e revelou ao confessor a visão que tivera. Manteve-se sempre calma e confiante, oferecendo a Deus o que lhe era mais caro: A realização de sua obra. Recebeu o hábito e fez os tão desejados votos”. Podendo então contemplar uma brilhante estrela que brilhava sobre a sua fronte e se refletia no seu sorriso. Essa estrela permaneceu até Santa Beatriz exalar o último suspiro, no dia 16 de agosto de 1491.
A Estrela da Imaculada continua a brilhar na Igreja através da proteção e da beleza espiritual de Santa Beatriz da Silva e das suas irmãs.
O Papa Francisco, na “Gaudete et Exsultate”, afirma: “Para um cristão, não é possível imaginar a própria missão na terra, sem a conceber como um caminho de santidade” (GE 19).
Na “Cristus Vivit”, fala dos “jovens santos” (CV 50). “Enamorados de Cristo, os jovens são chamados a dar testemunho do Evangelho em toda a parte, com a sua própria vida” (CV 175). Que os jovens de hoje tomem como exemplo e modelo a resposta de Santa Beatriz da Silva ao projeto de Deus.
Perante as adversidades, Santa Beatriz sentiu-se cheia de fortaleza. Foi isto precisamente que o Espírito Santo operou nela e continua a operar na Igreja (cf. DV 25).
Confiemos este mosteiro, as suas monjas e os jovens à proteção da Imaculada Conceição e de Santa Beatriz da Silva. Sigamos todos o caminho de Jesus, verdadeiramente apaixonados pela Santíssima Eucaristia, percorrendo o caminho de conversão, de oração, de contemplação e de santidade que nos deixou como testamento espiritual Santa Beatriz da Silva. Com Ela aprendamos a escolher o caminho da fidelidade e felicidade, que pelo coração Imaculado de Maria nos conduz ao próprio Deus.
Convento de Santa Beatriz, Viseu 17/08/2023
+ António Luciano, Bispo de Viseu