Observatório Pastoral
Já há caminho feito. Fazemos muito bem a muitos jovens na Igreja. Basta lembrar a ação de tantos centros juvenis ou ATL’s ligados à Igreja que no meio de realidades duras e devastadas pela miséria, devastadas por propostas de vida sem futuro, como a droga, são muitas vezes a casa segura onde muitos jovens podem fazer a experiência de serem amados sem que ninguém lhes pergunte se acreditam em Deus. Há também inúmeros movimentos e grupos de jovens que permitem a quem os frequenta ligar a fé à vida.
Há ainda muito caminho a fazer. A pastoral juvenil não pode ser uma pastoral do entretenimento em que o ser cool se torna um fim em si mesmo. É preciso que através de uma estética cuidada e apelativa (como a dos eventos desta JMJ) se ajude os jovens a tomar consciência que Deus os ama, fala com eles, e os convida a colaborar na missão reconciliadora de Jesus a partir do que são, sem medo do que são. É preciso fazer este caminho com eles, sem paternalismos, dando-lhe responsabilidades e participação efetiva em processos de decisão. (…)
Neste caminho há tentações a evitar. A primeira tentação a evitar é a tentação do triunfalismo. Os dias da JMJ foram extraordinários. Mas a Igreja não pode continuar a pensar-se a partir de uma atitude domínio. Somos apenas mais uma voz no espaço público. E para ser escutado, importa saber escutar, importa reconhecer que esta escuta é lugar em que o Espírito nos fala.
A segunda tentação a evitar é a do repetir tantas vezes a palavra todos que ela se torna vazia e oca. Há muitas pessoas que sentem ainda portas fechadas. Basta pensar nos deficientes cujo acesso aos lugares de celebração são difíceis ou impossíveis. Basta pensar em demasiadas comunidades imunes à pobreza, em católicos alérgicos ao acolhimento de migrantes. Basta pensar como facilmente reduzimos a defesa da vida aos importantes temas do aborto e da eutanásia, mas nos esquecemos de ser igualmente enfáticos e profetas em temas como a violência doméstica. Basta ainda pensar como tão facilmente nos dividimos quando falamos sobre temas relacionados com a dimensão afetiva e sexual (desde as relações pré-matrimoniais, passando pelas questões relacionadas com a orientação sexual ou a disforia de género, ou ainda com os divorciados recasados). Basta, finalmente pensar como persistem discursos muito próximos do ódio e da culpabilização dirigidos explicita ou implicitamente a vítimas de abuso sexual na Igreja.
São muitas portas a derrubar. Não vamos conseguir derruba-las todas ao mesmo tempo. Mas não podemos ignorar nenhuma destas situações se é nosso desejo levar a sério o convite do Papa a que a Igreja seja para todos. O todos, todos, todos do papa não é um slogan, é um caminho de conversão. Não é também um caminho instantâneo, exige tempo, paciência e vigilância. É um caminho em que todos são precisos.
A JMJ foi um tempo extraordinário e intenso. Sabemos que os grandes efeitos destes encontros se dão, na maioria das vezes, na biografia de milhares e milhares de peregrinos. Faltam evidências de que as Jornadas Mundiais da Juventude tenham efeitos profundos na estrutura eclesial. Mas isto não é uma fatalidade. Com humildade podemos fazer um caminho de pequenos e possíveis passos que nos vá aproximando de uma escuta sem poses e de uma Igreja sem medo e sem portas, aberta a todos!