Domingo à tarde. Entrei na igreja para me sentar a rezar e descansar um pouco, longe das reuniões, trabalhos a programar, coisas a fazer… Lá à frente estava alguém sentado com um terço na mão, óculos grossos, cabelo branco. Já de longe, a impressão de já o ter visto em algum lado. Aproximei-me e reconheci um velho amigo que não via havia pelo menos treze anos. Tínhamos trabalhado no mesmo bairro-de-lata durante vários anos.
Depois da primeira surpresa, ele explicou: a idade, e uma doença que já não lhe permitia continuar lá. E agora?, perguntei. Foi-me confiado um novo trabalho, disse, e mostrando o terço que tinha na mão, ajuntou: este!
Para ele, era mesmo um trabalho sério, exigente, e tão necessário como os muitos outros trabalhos que tinha conseguido realizar quando as forças físicas lho permitiam.
Nos dias a seguir àquele encontro, fui pensando no que aquele velho amigo me tinha dito, um trabalho importante! Mas para que serve, realmente?
Algumas respostas foram-me vindo, mesmo se me parecem ainda muito incompletas. Pensando nele e em outras pessoas desse género que tenho encontrado, parece-me que com aquela oração que fazem, muito mais abundante do que nós que continuamos num «trabalho normal», eles conseguem descobrir uma dimensão mais profunda em tudo. Até nos cantos mais difíceis da vida que vivem, eles conseguem ver uma graça de Deus. A tal ponto que lhes começa a faltar tempo para se lamentarem. Têm sempre pessoas por quem rezar, amigos, conhecidos, gente de quem sabem notícias pela TV ou pela rádio, e que tanto precisam de um apoio espiritual, mesmo de muito longe…
Uma destas pessoas disse-me aqui há tempos: escrevi o teu nome numa das minhas listas, tenho uma para cada dia da semana!
Pessoas que assumem este «novo trabalho», com o tempo que passa, vão mudando as coisas que pedem a Deus: ao princípio pedem coisas pequenas: Deus, ajuda aquele rapaz a passar o exame!, faz passar a dor de cabeça àquele doente… depois vão pedindo coisas mais importantes: ajuda-me a perdoar a mim mesmo o meu passado, e a encontrar a paz de coração, reforça a generosidade de quem trabalha pela paz no mundo…
Uma coisa que me impressiona sempre nestes zeladores é a certeza absoluta que eles têm de que não andam a perder tempo: a certeza de que as orações que oferecem a Deus com insistência e grande abundância vão certamente produzir frutos. Será quando e como Deus quiser, mas os frutos vão chegar com toda a certeza.
Há mesmo quem reze sem intenções particulares. Como me dizia uma destas pessoas: «Eu rezo e basta: Deus sabe melhor do que eu quem é que precisa da ajuda das minhas orações!».
Ao princípio, este «novo trabalho» não deve ser nada fácil, sobretudo para pessoas que sempre tiveram uma vida muito ativa e realizaram obras grandes. Penso naquele meu velho amigo missionário que encontrei com o terço na mão. Mas depois de algum tempo, é lindo ver estas pessoas que irradiam alegria e serenidade, com a certeza de que continuam a ter muito que dar a todos nós e ao nosso mundo.
Pe. Fernando Domingues, Missionário Comboniano