A ‘Teresinha’ era uma das velhas companheiras dos tempos em que o Padre Tiago Varanda viveu em Gumirães, no concelho de Viseu, e onde praticamente começou a sua caminhada de compromisso com a Igreja.
A amiga aguardava ansiosa a sua chegada tal como muitos outros velhos companheiros do tempo da sua juventude desejosos de o congratularem pela ordenação como primeiro Padre cego a ser ordenado em Portugal. Tiago Varanda voltou à comunidade para celebrar a Missa Nova, ao final da tarde de 27 de julho (sábado), na Igreja de Gumirães.
“Posso quase dizer que foi através desta Paróquia que praticamente surgiu a minha vocação. Na adolescência tinha sentido qualquer coisa, mas a sério a sério foi quando já vivia aqui [em Gumirães] e foi ao longo deste ensinamento vocacional que fui integrando na Igreja”, adiantou o Padre Tiago Varanda numa entrevista ao Jornal da Beira antes de presidir à celebração da eucaristia.
Sete anos de formação no Seminário Conciliar de Braga culminam com a ordenação sacerdotal a 14 de julho. Natural de Lamego, o sacerdote de 35 anos nasceu com um glaucoma congénito; perdeu a visão progressivamente e aos 16 anos já dependia da sua companheira da altura, uma cadela-guia. frequentou o curso de História, na Universidade Católica em Viseu, e foi na comunidade de Gumirães onde viveu com a família durante “bastantes anos”.
O regresso além de esperado foi surpreendente. Os jovens do Grupo Cordas entregaram ao Padre uma mensagem escrita em braile. “É para que possas ler sempre que te lembrares de nós. Gumirães será sempre a tua casa”, referiu um dos elementos do grupo na tal mensagem que vai poder recordar: “Somos felizes por te vermos arriscar”.
Tiago Varanda recebeu ainda um CD com cânticos de Taizé, um terço benzido pelo Papa Francisco na viagem do ‘Cordas’ a Roma, flores das crianças da catequese e o Paramento que usou na eucaristia foi oferecido pela comunidade da Igreja de Gumirães, como reconhecimento “por tudo o que foi na comunidade como paroquiano e na Santa Igreja”, acrescentou o Cónego Manuel Matos, responsável pela Paroquia de Santa Maria.
“Vivi nesta comunidade bastantes anos. Foi aqui que comecei a colaborar mais concretamente na igreja e na Paróquia, primeiro no coro, depois leitor. Foi aqui que conheci bastantes pessoas que me ajudaram a integrar na Igreja e a comprometer-me com a Igreja, por isso, sinto uma alegria muito grande por vir aqui celebrar com estas pessoas que me ajudaram a crescer na fé e na minha vocação”, agradeceu o Padre ao longo da conversa com o Jornal da Beira.
A adaptação da liturgia em braille e uma ajuda nos primeiros tempos vão permitir ao Padre Tiago Varanda fazer tudo o que fazem os seus colegas. Um mês depois da ordenação, descreve “dias diferentes” com mais trabalho e cheios de expetativas: “Um novo horizonte, a mesma vida e uma nova vida. A mesma vida porque sou o mesmo Tiago, isto não surgiu de um dia para o outro, vem de uma caminhada de há muitos anos, no fundo estou na continuação. Com a ordenação o trabalho e a responsabilidade são outros e vou-me preparando para as novas responsabilidades que me forem confiadas, com a esperança de que Jesus Cristo me dê sempre a sua graça para corresponder à sua vontade”.
Ainda sem saber o que o espera revelou o interesse constante em “conhecer outras realidades”, tendo sido a passagem pelo Santuário de Fátima o maior desafio dos últimos dias. “Logo após a minha ordenação estive dois dias em Fátima onde pude celebrar Missa e pude dedicar-me às confissões, foi uma experiência muito enriquecedora em que conheci a realidade do santuário”, adiantou.
Determinado nas palavras, o Padre Tiago Varanda reconhece que ao longo de uma preparação de sete anos, foi perdendo os receios que o podiam impedir de ser um dia ordenado sacerdote e hoje, durante a celebração, a mensagem que passa é sobretudo de “esperança” lembrando que “o reconhecimento das fragilidades” permite caminhar em frente.
“A minha mensagem central destes tempos após a ordenação, de que Jesus Cristo seja sempre o centro da nossa vida, porque é por ele que estou aqui, foi ele que me cativou. Os jovens que nunca tenham medo de fazer de Jesus seu companheiro de vida, seu amigo íntimo aquele que verdadeiramente poderá dar um sentido mais profundo às suas vidas”, enfatizou, lembrando que vai no sentido do seu lema de ordenação – Que Jesus Cristo cresça e que eu diminua – “acima de tudo não sou eu o Tiago que importa, importa o Sacerdote de Cristo e é no Mistério de Cristo que participo como sacerdote, é ele que importa crescer nos corações de cada pessoa”, concluiu.
G.I./J.B.:EA