O lema da minha ordenação foi…
Como lema escolhi dois pensamentos que, embora distintos, se complementam e me orientam no pensamento e na ação sacerdotal, dia após dia.
“Quem vive para os altos ideais, deve esquecer-se de si próprio…” (Feuerbach) e “Darei o que é meu e me darei a mim mesmo pela vossa salvação.” (2Cor. 12, 15). Ao longo da minha caminhada sacerdotal, procurei nortear-me por este(s) lema(s), embora nem sempre seja fácil, tendo em conta a nossa própria essência, a pessoa do outro e a(s) comunidade(s) que somos chamados a servir. Quando vivemos para os altos ideais, vivemos não apenas em função de nós mesmos, mas aspiramos a ideais mais elevados: viver para e com os outros, sem deixar de ter em conta a individualidade de cada um. Porém, Cristo é o mais alto ideal na aspiração pessoal e vocacional. Esquecermo-nos de nós próprios não significa deixarmos de viver, mas termos a capacidade de viver com… com todos nas suas alegrias e tristezas, nas sua forças ou fraquezas, tendo a capacidade de, empaticamente, nos doarmos à maneira de Jesus Cristo. Por isso, darmos o que é nosso, mais do que darmos algo que possa ser efémero, é doarmo-nos de alma e coração ao outro. Para que ele, encontre em nós uma pista que o leve a encontrar(-se) no caminho com a fonte de vida e de salvação.
E hoje leio-o…
Nos dias de hoje, este(s) lema(s) tornam-se, cada vez mais, atuais e desafiantes. Em primeiro lugar, tento calar as “vozes interiores/exteriores” para escutar o silêncio, a vida, o coração, a vocação. É neste silêncio que escutamos o Deus que fala e que tantas vezes nos convida a estarmos atentos a nós e ao outro, sobretudo aqueles que, as muitas circunstâncias da vida, fere e magoa, provocando o vazio circunstancial e o vazio da alma.
Esquecermo-nos de nós mesmos, num mundo que parece viver ensimesmado, provoca-nos a necessidade de sairmos da nossa zona de conforto, pessoal e até mesmo espiritual, para podermos, numa atitude de entrega e (do)ação levar, através de uma palavra, de um gesto, de uma atitude, ao outro o (re)conforto que tantas vezes necessita de uma presença amiga e espiritual para se (re)erguer para continuar o caminho e a caminhada de/na vida.
Por isso acredito: “Quem vive para os altos ideais, deve esquecer-se de si próprio…” (Feuerbach) e continuarei a fazer o propósito de: “Dar o que é meu e me dar a mim mesmo pela vossa salvação.” (2Cor. 12, 15).
Nestes 25 anos de sacerdócio, a forma como vejo a Igreja…
A Igreja de hoje é a Igreja de sempre: a Igreja de e com Jesus Cristo.
Porém, existem cristão que, ao longo dos tempos, são chamados a ser e a (re)construir, dia após dia, esta Igreja à qual pertencemos e da qual fazemos parte como corpo.
A forma de viver e ser Igreja é que tem mudado. É preciso: sentir, pulsar e olhar os “sinais dos tempos” em cada tempo, isto é, o desafio que nos é lançado a sermos Igreja de Jesus Cristo, num tempo concreto, que podemos dizer que é o nosso hoje.
Os desafios pessoais, sociais e pastorais que hoje nos são lançados são muitos desde logo a urgência de sermos uma Igreja (cor)responsável, um a Igreja viva e missionária.
Estes desafios que surgem impelem-nos a sermos cristãos praticantes de vida e na vida eclesial de várias formas: através da celebração sacramental, da oração e da (re)ação do nosso ser cristão em e na sociedade à qual pertencemos, deixando de “ter medo” de nos afirmarmos e sermos verdadeiramente Igreja comunhão. Para isso, temos que nos desinstalar e…: sentirmo-nos missionários e evangelizadores; assumimo-nos como cristão e vivermos como tal; sairmos da “Igreja casa comum” e sermos “Igreja viva” aberta aos desafios e, sobretudo, ao desafio do outro no amor e na caridade, na atenção, no respeito, na partilha, na solidariedade… Em suma: “termos um só coração e uma só alma”… (Act. 4, 32)
Hoje, sentir-se chamado é ….
Hoje, sentir-se(me) chamado é ser capaz de fazer calar o ruido exterior e termos a capacidade de escutar a voz do silêncio que nos toca, chama, fala e impele para a ação.
O meu (nosso) chamamento, nos dias de hoje, tem várias dimensões: pessoal, social, eclesial. Contudo, hoje mais do que nunca, urge a necessidade de alimentarmos o nosso eu espiritual, escutando Aquela Voz que nos desafia e impele para ser Igreja Viva e missionária. Para tal, precisamos de (re)orientar a nossa (re)ação de modo a que estimulemos a atenção a nós próprios e aos outros para que sejamos capazes de: mais do que ver, despertarmos a atitude de olhar; mais do que ouvir, cultivarmos a arte da escuta; mais do que estar longe, sermos presença ativa, ainda que, em muitos momentos, silenciosa.
Em suma, sentir-se(me) chamado é dizer sim e sentir-se(me) presente junto do outro que chama.
Um episódio que me marcou, nestes anos, foi…
Bem… não poderei salientar um episódio que me marcou nestes anos, porque a vida, toda ela, é uma sucessão de momentos marcantes (bons ou menos bons) e, salientar um, poderia estar a ser “injusto/ingrato” comigo mesmo e com os outros que fizeram ou fazem parte da minha caminhada.
O que saliento, isso sim, é um caminho e uma caminhada marcada por momentos vividos em contexto paroquial, escolar, militar e hospitalar. Em todos eles, tive e tenho vivido experiências marcantes que me fizeram e fazem crescer como pessoa, como padre, como “Imagem de Jesus Cristo”.
Para os próximos anos, sinto-me…
O futuro, como diz o nosso povo, a Deus pertence…
Poderei dizer que hoje… sinto-me… Sinto-me com fé, com esperança, com confiança, com vontade de continuar a aceitar o(s) desafio(s) que Deus me vais propondo dia após dia. Tendo os olhos postos na Igreja de hoje, observando os sinais dos tempos, (re)adaptando a (re)ação à pastoral de serviço e missionária esforçar-me-ei por servi-la com o melhor que posso e sei, com a força de Deus, sob a orientação de Cristo, o Bom Pastor, deixando-me nortear pelo(s) meu(s) lema(s) da Ordenação Sacerdotal: “Quem vive para os altos ideais, deve esquecer-se de si próprio…” (Feuerbach) e “Dando o que é meu me darei a mim mesmo pela salvação de todos.” (2Cor. 12, 15).