Observatório Pastoral
A Quaresma deste ano, vivida também como caminho de escuta e consulta do povo de Deus que a Igreja está a promover nas igrejas particulares de todo o mundo, levou-me a pensar mais profundamente no Sínodo, «o caminho que Deus espera da Igreja para o terceiro milénio» (Documento Preparatório para o Sínodo, 2).
Reconheço, em primeiro lugar, o grande desafio que a Igreja Portuguesa está a viver para consolidar um processo de experiência sinodal num tempo onde a pandemia, as consequências da invasão russa à Ucrânia e a preparação para as JMJ emergem como “desafios” centrais para a nossa pastoral. Estou convencido, inclusive, que muitos se perguntam: mas porque é que o Papa se lembrou de lançar este Sínodo nesta altura? Não podia esperar que “isto passasse”? É tanta coisa ao mesmo tempo… Reside, aqui, penso, a questão central para percorrer um caminho sinodal: o Papa Francisco fala-nos de uma forma de ser Igreja e nós, em geral, compreendemos que nos estão a ser pedidas mais atividades. Acolhemos o convite como algo a fazer e não como um caminho de conversão pessoal e comunitária que vem renovar o nosso agir pastoral (EG, 27). Sim. Há ações pastorais nas nossas comunidades que podem não ter sentido hoje e outras que podem ser necessárias, mas, sobretudo, todas elas podem ser sinodais. Este é o desafio do Papa, que concretizando o discernimento do Concílio Vaticano II, nos convida a perceber que o tempo tem a ver com o «ser» e não com o «fazer».
É por isso que acredito que uma verdadeira fase de escuta nas nossas comunidades torna-se mais fácil quando parte da experiência da cultura do encontro. Sem esta cultura da comunhão eclesial e da fraternidade social, vai ser difícil dialogarmos sobre as questões que o Documento Preparatório para o Sínodo nos propõe. E neste caminho para a Páscoa identifiquei 2 aspetos que precisam da nossa atenção e, possivelmente, de conversão:
A liderança. O reconhecimento de que o envolvimento de todos os batizados na responsabilidade da Igreja ainda está muito dependente do “interesse” do padre, leva-me a concluir que a cultura do encontro acontece, em grande parte, pela forma como é vivido o governo das comunidades que lhe é confiado. O serviço da autoridade (Mc 10, 41-45), sem nunca perder a sua identidade (LG, 28), não pode ficar confinado a um modelo de pastor-presidente ou moderador, mas deve abrir-se a um modelo de guia pastoral que lidere um processo de discernimento que chama, motiva, corresponsabiliza e envia em missão toda a comunidade. Numa época em que se vê o mundo a cores, mas que na hora de o avaliar, se decide a preto e branco, este modelo de liderança é fundamental para que a comunidade cristã seja lugar de «comunhão, participação e missão».
A comunicação. Não duvido que a proposta de uma Igreja sinodal para o terceiro milénio resulta da atenção aos sinais dos tempos. Esta nova época que pede à Igreja uma atitude renovada de escuta, não deve ficar sem resposta. E o Sínodo, com esta primeira fase, quer impulsionar a Igreja para uma nova experiência de escuta: de Deus, de mim mesmo, do ser humano e da casa comum. É neste passo que temo que possamos enveredar por um método mais sociológico e menos espiritual. Ou seja, ficarmos pela escuta de opiniões e não experimentar a escuta ativa e o discernimento comunitário. É importante escutar o outro, o que pensa, o que sugere… mas se isso não é feito de forma presencial, olhos nos olhos, no calor do diálogo e até de uma certa crispação, então não haverá verdadeira conversão e escuta. Só pode haver «caminhar juntos» se houver comunicação. E, esta, começa na certeza de que nos reunimos em «nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo». Portanto a recolha de opiniões é importante, mas se não gera encontro e não leva à compaixão, participando das dores e esperanças do outro, então será difícil descobrir que todos estamos à escuta do Espírito Santo (Act 10).
Concluo, pois, com a certeza de que a liderança e a comunicação, sendo dois dos indicadores da capacidade da Igreja em acolher as espectativas de cada um, nos ajudam a perceber até que ponto caminhamos juntos para a Páscoa.