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Observatório Pastoral

A parábola dos talentos (Mateus 25, 14-30) é hoje, a meu ver, perigosa: perigosa porque muitas vezes a ouvi comentar de uma maneira que, em vez de impelir os cristãos à conversão, parece confirmá-los no seu atual comportamento entre os outros homens e mulheres, no mundo e na Igreja.

Na verdade, esta parábola não é uma exaltação, um aplauso à eficiência, não é um hino à meritocracia, mas é uma verdadeira e autêntica contestação em relação ao cristão que muitas vezes é morno, sem iniciativa, satisfeito por aquilo que faz, receoso operante à mudança exigida pelos novos desafios ou pelas alteradas condições culturais da sociedade.

A parábola não confirma nem o “ativismo pastoral” em que caem muitas comunidades cristãs, muitos “agentes pastorais” que não sabem ler a esterilidade de todo o seu esforço, mas pede à comunidade cristã consciência, responsabilidade, laboriosidade, audácia e sobretudo criatividade. Não é a quantidade do fazer, das obras, nem o ganhar prosélitos que tornam cristã uma comunidade, mas a sua obediência à Palavra do Senhor que a impulsiona para novas fronteiras.

Leiamos então com inteligência esta parábola:

Na parábola, a dois servos o Senhor deixou muito, uma quantia substancial para que a façam frutificar; a um terceiro servo deixou um só lingote, que ainda assim não é pouco. Em todos eles depositou a sua confiança sem limites, confiando-lhes os seus bens. Cabe por isso aos servos não trair a grande confiança do proprietário e realizar uma sábia gestão dos bens. A cada um o proprietário dá em função da sua capacidade, e o seu dom é também uma tarefa: cuidar e fazer frutificar.

Para além da imagem dos talentos, o que é este dom, em definitivo? Segundo Ireneu de Lyon é a vida concedida por Deus a cada pessoa. A vida é um dom que não deve absolutamente ser desperdiçado. Infelizmente, temos de o constatar, para alguns a vida não tem valor algum. Porém só se vive uma vez, e fazê-lo com consciência e responsabilidade é decisivo para salvar uma vida ou perdê-la.

«Após muito tempo», o proprietário regressa e pede contas da confiança por ele colocada nos seus servos, os quais devem mostrar a sua capacidade de ser responsáveis, isto é, capazes de responder à confiança recebida.

Aquele que tinha recebido cinco talentos mostrou-se trabalhador, empreendedor, capaz de arriscar; por isso, quando entrega ao proprietário dez talentos, recebe dele o elogio: «Bem, servo bom e fiel (…) entra na alegria do teu Senhor». Acontece o mesmo para o segundo servo, também ele capaz de duplicar os talentos recebidos.

Vem por fim aquele que tinha recebido um só talento, e ao estender as mãos manifesta o pensamento que o paralisou: «Desde quando me deste o talento, eu sabia que és um homem duro, exigente, que faz aquilo que quer, e recolhes também onde não semeias». Com estas palavras o servo confessa que fabricou uma imagem distorcida do senhor e pela sua incapacidade de ter confiança no outro. Tendo esta imagem em si, optou por não correr riscos: colocou em segurança, debaixo da terra, o dinheiro recebido, e agora restitui-o tal e qual. Assim devolve ao dono aquilo que é seu e não rouba, não peca…

Mas eis que o senhor se encoleriza e lhe responde: “És um servo malvado e preguiçoso. Foste preguiçoso, não foste de confiança. Não cuidaste do meu bem a ti confiado”.

Sim, sabemo-lo: é mais fácil enterrar os dons que Deus nos deu, em vez de os partilhar; é mais fácil conservar as posições, os tesouros do passado, do que ir descobrir novos; é mais fácil desconfiar do outro que nos fez o bem em vez de responder conscientemente, na liberdade e por amor. Este servo não fez o mal; ainda pior, não fez nada! (…)

Enzo Bianchi, In Altrimenti

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