
Todas estas experiências são profundamente traumáticas e levam a dizer coisas menos inesperadas e incompreensíveis para quem não passou por situações análogas. Não é prudente emitir um juízo simplista sobre os escritos e o descrito nestas experiências.
Não é incomum que, por vezes, a vítima se dirija a Deus, em tom acusatório, numa espécie de alívio e desabafo, que se pode converter em diálogo e em oração. Talvez se Deus tivesse criado o ser humano com um ‘chip’ programado não existiria tanto mal. Talvez se o ser humano, em vez de livre, tivesse sido construído como uma ‘marioneta’, o mal não fosse tão grave ou alargado. Mas a ‘liberdade rebelde’ do ser humano ‘permite-lhe’ realizar coisas impensáveis, causar danos irreparáveis, beligerar por qualquer motivo banal, invertendo o sentido do efémero com o perene. Consideramos que grande parte das vítimas não pretende carregar o féretro no ‘funeral’ de Deus, mas pugna para que Ele Se mantenha Vivo para vivificar, realizando o Seu objetivo fundamental que é dar vida. No fundo, esta vontade primeira do ‘aniquilamento’ de Deus deriva da autodestruição do ser humano noutro ser humano.
A vontade destes autores não é colocar Deus no banco dos réus, mas experimentar a Sua Presença no ‘lugar’ da vítima, do oprimido e do ‘exterminado’. Este ‘estar ao lado do fragilizado’ foi-nos mostrado pelo próprio Jesus que, sem a pretensão de aniquilar o opressor, procurou reabilitar a vítima, conferindo sentido à existência. Talvez o objetivo não seja pôr Deus em causa, ou negar a sua existência, mas dirigir o seu grito de dor para o único ‘Lugar’ de onde pode vir uma resposta satisfatória… Todas estas experiências, que elencámos no artigo anterior, são profundamente traumáticas.
Não é prudente emitir um juízo simplista sobre os escritos e o descrito. Não é incomum que a vítima se dirija a Deus, num tom acusatório, que se pode converter em diálogo orante. Talvez se Deus tivesse criado o ser humano com um ‘chip’ programado, ou como uma ‘marioneta’, o mal não fosse tão grave. Mas a sua ‘liberdade rebelde’ permite-lhe realizar coisas impensáveis, causar danos irreparáveis, beligerar por motivos banais. Consideramos que parte das vítimas não pretende carregar o féretro no ‘funeral’ de Deus, mas pugna para que Se mantenha Vivo para vivificar.
A sua vontade não é colocar Deus no banco dos réus, mas experimentar a Sua Presença no ‘lugar’ da vítima. Deixamos, agora, alguma reflexão no contexto bíblico. Muitos procuram na Bíblia uma resposta para o problema do mal e do sofrimento. Na verdade, a Bíblia não oferece uma resposta, mas uma diversidade de perspetivas sobre esta realidade. Os chamados livros históricos do Antigo testamento relatam a Aliança entre Deus e o Povo. Esta ‘espiritualidade da escolha’ marcaria a mentalidade deste Povo. Mas quando as coisas se começaram a complicar e o Reino foi destruído em 722 e 586, muitos se voltaram a interrogar por que razão Deus ‘omitiu’ a sua proteção e os entregou à sorte de outros povos mais fortes e cruéis. Os profetas formam um grupo que ensaiaram uma resposta para esta problemática. Defendiam, resumidamente, que as desgraças nacionais derivavam da desobediência do Povo à vontade de Deus. Os profetas não devem ser considerados como adivinhos do futuro. Eles estavam muito preocupados e inseridos no seu tempo e circunstâncias, tentando ser porta voz da vontade de Deus para as pessoas da sua época. Eram pessoas encarnadas na problemática global envolvente.
A Bíblia leva em consideração dois grupos: os não escritores, que seriam em maior número, e os escritores (15). O sofrimento coletivo e individual era encarado como um castigo direto de Deus, como consequência do pecado e do afastamento de Deus e suas leis. Esta mentalidade tinha um objetivo pedagógico e um substrato de bondade: para que o povo vivesse bem e feliz, bastava seguir Lei de Deus. (continua…)
P. Virgílio Marques Rodrigues