Não haverá comunidade, rural ou urbana, cujo imaginário colectivo, cultural ou religioso, não inclua alguma expressão artística, cultual, de índole mais ou menos popular ou canónico litúrgico, dedicado a Maria, Mãe de Cristo e da Igreja, normalmente sob o epíteto de ‘Nossa Senhora’. A atestá-lo, a grande quantidade de invocações marianas presentes na toponímia de ruas e lugares, ermidas, edifícios de culto, festividades, procissões, romarias, o terço em Maio, Outubro e outras. Sessenta, das duzentas e oito paróquias da nossa diocese, têm-na como padroeira e centenas de igrejas lhe são dedicadas. No âmbito nacional e internacional, consideremos os grandes santuários Marianos: Fátima, Lourdes, Guadalupe, e outras. O culto a Maria, Mãe de Jesus e da igreja – que em Maio se expressa com intensa singularidade – remonta aos primórdios do cristianismo. Foi, porém, a partir do séc. V, após o Concílio de Éfeso em 431, no qual se proclamou Maria como “Mãe de Deus”, que o culto mariano adquiriu novo vigor. Desde então, cresceu admiravelmente o amor e a veneração cultual a Maria. Cumpriam-se as proféticas palavras: “Todas as gerações me proclamarão Bem-aventurada, porque o Todo-Poderoso fez em mim maravilhas”(Lc 1, 48-49). Ao longo dos séculos, o culto mariano foi-se arraigando no povo cristão, com diversíssimas invocações. Já no séc. XX, declara o concílio Vaticano II: “Na celebração do ciclo anual dos mistérios de Cristo, a santa Igreja venera com especial amor, porque indissoluvelmente unida à obra de salvação do seu Filho, a Bem-aventurada Virgem Maria, Mãe de Deus, em quem vê e exalta o mais excelso fruto da Redenção, em quem contempla, qual imagem puríssima, o que ela, toda ela, com alegria deseja e espera ser” (SC. 103).
Nesta síntese, explicitam-se e justificam-se os motivos que fundamentam o culto a Maria. Não obstante, tendo ela um lugar inigualável entre os humanos, a primazia do núcleo da fé e da celebração eclesiais têm Cristo como referência, aos quais ela está intimamente unida. E como tal a louvamos, desde a Concepção à Páscoa da plena Redenção. Este vínculo de proximidade, comunhão e contributo singular de Maria no processo salvador do Filho, não concedem a Maria natureza divina nem, por si só, redentora, mas conferem-lhe o estatuto da melhor e mais perfeita imagem da Igreja redimida e peregrina. Aí reside o fundamento e significado teológico das principais solenidades e festas marianas, expostas no actual calendário litúrgico de 21 de março de 1969.
Paulo VI na exortação “Marialis Cultus” (1974 (cf. 1-10) aprofunda o significado das diversas solenidades, festas e devoções marianas, situando adequadamente o culto a Maria e sua estreita relação com Cristo, em quatro solenidades: Imaculada Conceição (8 de Dezembro); Santa Maria Mãe de Deus (1 de Janeiro); Anunciação do Senhor (25 de Março) e Assunção de Maria (15 de agosto) – ou Dormição de Maria, assim designada pelos irmãos orientais, e nas três festas: a Apresentação do Senhor (2 de Fevereiro), a Visitação de Maria (31 de Maio) e a Natividade de Maria (8 de setembro). Nelas, são patentes a dupla dimensão cristológica e mariana. Na verdade, toda a devoção mariana é sempre cristológica. Em continuidade com MC, João Paulo II, na encíclica “Redemptoris Mater” (1987), o Catecismo da Igreja Católica (1997) e outros documentos ocasionais clarificaram o culto mariano, por vezes um tanto emotivo e desvinculado da autêntica Tradição e dos critérios conciliares.
Com Francisco, oramos a Maria “que nos ajude, para que a Igreja seja casa para muitos, mãe para todos, e torne possível o nascimento de um mundo novo” (A Alegria do Evangelho, 288).
P. José Henrique Santos