A propósito do próximo Dia Mundial do Doente, o nosso Bispo propõe-nos uma reflexão, que transcrevemos:
1. O Papa Francisco escolheu as palavras de Jesus: “Recebestes de graça, dai de graça” (Mt 10,8) para nos convidar a celebrar o 27º Dia Mundial do Doente, no dia 11 de fevereiro de 2019, que este ano tem o seu ponto alto em Calcutá, na Índia, onde o exemplo e serviço de caridade de Santa Teresa junto dos pobres, dos doentes e dos moribundos nos inspira a cuidarmos com amor os nossos irmãos.
A data é assinalada no aniversário da 1ª aparição de Nossa Senhora em Lourdes, na França.
O Santuário de Lourdes, lugar rico de simbolismo e mistério para com os doentes e o mundo do sofrimento, envolve-nos na ternura de Deus e de Maria reveladas à pequena Bernardete, pobre e doente, para experimentarmos a riqueza deste dom que nos abre ao diálogo, à cooperação humana entre povos e culturas e se faz presença de salvação no cuidado pelos mais frágeis e doentes.
Sob o olhar da Virgem, podemos acolher por excelência o “dom” de Deus e vivê-lo no “serviço gratuito” a toda a pessoa humana.
Maria, a cuidadora exemplar da humanidade, a “Salus Infirmorum”, oferece-nos Jesus, o “Verbo Encarnado”, o Salvador do mundo que cura e liberta. A Mãe de Jesus quer agora, através da Igreja, ajudar-nos a viver o Dia Mundial do Doente como uma oportunidade de reflexão, de oração e estudo sobre o valor da vida humana. O mistério que nos envolve na grandeza e na fragilidade da pessoa humana, o cuidado que devemos ter com os doentes, a abertura ao dom sobrenatural e espiritual, dão sentido e valor salvífico à experiência da dor e do sofrimento que afeta todo o ser humano.
2. Ao olharmos para o horizonte do mundo da saúde e dos cuidados a prestar aos doentes, da terapêutica de aliviar a dor e o sofrimento humano, da missão e responsabilidade dos serviços de administração hospitalar, dos gestores em saúde, dos médicos, dos enfermeiros, dos técnicos e operacionais de saúde, dos capelães e dos assistentes espirituais, dos voluntários, das famílias, e de toda a comunidade, devemos procurar as melhores respostas em saúde para que este “dom” nos leve a realizar as melhores práticas, isto é, a buscar uma melhor saúde para todos.
3. O Papa, ao falar do dom, do cuidar e do humanizar, desafia os cristãos e a humanidade inteira a tomar consciência da importante missão que temos junto dos próprios doentes. A vida humana é um dom de Deus e São Paulo interpela-nos dizendo: “que tens tu que não tenhas recebido?” (1 Cor 4,7).
A reciprocidade da nossa vida é um dom de Deus que deve ser orientada para o cuidar dos outros, procurando sempre o maior bem perante as conquistas alcançadas pelos avanços da medicina e das biotecnologias que devem estar sempre ao serviço da pessoa humana, promovendo a sua dignidade e nunca favorecendo as formas de uma expressa manipulação.
4. O humanizar os cuidados de saúde e o promover a verdadeira qualidade de vida, o cuidar com a razão e o coração, desafia-nos a sair do nosso egocentrismo, do nosso individualismo, lutando com coragem contra uma cultura do descartável e da indiferença, hoje tão presente nas relações humanas e sociais. É aqui que o “dom” como modelo de entrega, de serviço, de comunhão e empatia se transforma num antídoto contra a indiferença, abrindo-nos espaço para um caminho mais credível na evangelização, onde os nossos gestos de gratuidade se identificam com o agir do Bom Samaritano.
O dom, recorda o Papa Francisco, é um cuidar na gratuidade, paradigma que desafia o crente perante o individualismo e a fragmentação social dos nossos dias.
Como pessoas de bem, conhecedores desta realidade tão vulnerável da nossa sociedade, precisamos de refazer um caminho de dar a conhecer ao outro a alegria do dom gratuito capaz de nos dar um indicador mesurável da saúde do cristão. O dom vivido e testemunhado pelos profissionais de saúde poderá ser o remédio contra a cultura vigente nos mais diversos ambientes e instituições de saúde.
Para o cristão, o “dom” do serviço aos doentes e ao próximo aparece como o reflexo do amor gratuito de Deus Pai que culmina na Encarnação do Seu Filho Unigénito Jesus Cristo. Aquele que salva e cura a humanidade ferida envia o Espírito Santo que renova e vivifica a nossa pobre existência humana.
Os apóstolos espalharam o Evangelho da Alegria e da Conversão através de gestos de amor gratuito e de sinais salvíficos do Reino junto dos doentes.
5. O exemplo de Santa Teresa de Calcutá junto dos pobres, dos doentes e dos moribundos leva o Papa Francisco a apresentar o seu exemplo de caridade como modelo de serviço voluntário aos outros nos nossos dias. Para ela, o único critério de ação era o amor gratuito para com todos sem distinção de língua, cultura, etnia e religião. O seu testemunho faz-nos descobrir que a misericórdia foi para ela o “sal” que dava sabor a todas as suas obras e a “luz” que iluminava a escuridão daqueles que choravam e exprimiam as suas próprias dores e sofrimentos. O seu exemplo de vida continua atualíssimo e é uma referência a guiar-nos na abertura de horizontes de alegria e de esperança para a humanidade fragilizada e necessitada de compreensão e ternura, especialmente as pessoas que mais sofrem nas periferias existenciais das nossas paróquias.
O cuidar dos doentes precisa de profissionalismo, de ternura, de gestos gratuitos, imediatos e simples, onde o acolher com amor nos faz sentir quanto o outro nos é “querido”.
Todo o homem é pobre, necessitado e indigente, de forma que, em cada fase da vida, nunca será possível ver-se livre da necessidade de ser ajudado e ser cuidado.
É um convite a cuidar dos doentes com responsabilidade, lealdade, humildade, praticando, com coragem, a solidariedade como virtude indispensável para aliviar o sofrimento e a indigência da pessoa humana.
6. A humanização e a gratuidade são o fermento de uma ação específica de voluntariado. A dimensão da gratuidade deve animar as instituições católicas e outras a promover a cultura da gratuidade e do voluntariado, um dom indispensável para superar a cultura do lucro e do descartável.
A alegria do dom gratuito é um indicador apontado pelo Papa para um bom serviço prestado pelos voluntários junto dos doentes e deste modo lhe expressa o “seu agradecimento e encorajamento”. Lembra ainda na mensagem que “o voluntário é um amigo desinteressado, a quem se pode confidenciar pensamentos e emoções, é através da escuta que ele cria as condições para que o doente deixe de ser objeto passivo de cuidados para se tornar um sujeito ativo e protagonista de uma relação de reciprocidade capaz de recuperar a esperança e disposição para aceitar as novas terapias. O voluntário comunica valores, comportamentos e estilos de vida que têm no centro o fermento da doação”. A este modo de cuidar junta-se também a humanização dos tratamentos e cuidados de saúde.
7. A mensagem termina com uma atitude de esperança e confiança: “Confio todos a Maria: os doentes e os seus cuidadores, a humanidade frágil e sofredora, tudo entrego aos cuidados maternos de Nossa Senhora. Que Ela nos ajude a partilhar os dons recebidos com um espírito de verdadeiro diálogo e acolhimento, a vivermos como irmãos e irmãs atentos às necessidades do próximo, a saber dar com o coração generoso e a aprender a dimensão do serviço desinteressado”.
Aos cuidados solícitos de Deus confiamos os nossos doentes e todos os seus cuidadores, e imploramos para todos a perfeita saúde da alma e do corpo e, por intercessão da Bem-Aventurada Virgem Maria, concedei-nos as graças que mais precisamos na terra, para um dia sermos felizes no Céu. Amem.
+ António Luciano dos Santos Costa, Bispo de Viseu
G.I.