Open/Close Menu A Diocese de Viseu é uma circunscrição eclesiástica da Igreja Católica em Portugal

O lema da minha ordenação foi extraído do Profeta Jeremias: “A quem Eu te enviar, irás e o que Eu te ordenar, falarás. Não temas diante deles, porque Eu estou contigo para te salvar” (Jer. 1, 7-8).

Hoje, decorridos 25 anos, leio-o, não digo de forma diferente de então, mas mais amadurecidamente. Ser sacerdote é exercer o sacerdócio em nome de

alguém e não em nome próprio. Esse alguém é Deus, Deus que comunica de muitos modos com a humanidade, desde o início desta. A determinada altura, escolheu Abraão, escolheu os profetas, entre os quais Jeremias, até que Jesus Cristo se fez um de nós. Em Cristo, temos a Palavra divina em pessoa. Mas Cristo, assumindo a nossa condição humana, também aceitou o estar limitado ao tempo, o partir para o Pai, deixando de estar visível entre nós, como esteve nos seus trinta e poucos anos de existência humana. Porém, não nos abandonou, deixando-nos a Igreja, o novo povo de Deus, para continuar a sua missão. É este continuar a Sua missão a que somos chamados. Assim, ser sacerdote significa estar consciente de que a sua missão, o seu ministério tem origem em Deus, em Cristo, não em nome próprio; que fala em nome de Cristo, não transmitindo uma doutrina pessoal; que se dirige não a quem deseja, mas a quem Deus lhe ordena, quer pertença ao Seu Povo, quer não.

A divina Palavra é para as pessoas, todas as pessoas. Existem pessoas que a aceitam e pessoas que a rejeitem, que a combatem. Ser sacerdote implica transmitir, propor esta Palavra como ela é, sempre confiando em Deus, pois é Deus quem acompanha o sacerdote, encorajando-o, incentivando-o, salvando-o dos medos, das inquietudes que podem surgir na missão.

 

Nestes 25 anos de sacerdócio, vejo a Igreja como povo peregrino. É constituída por pessoas batizadas, com as suas virtudes e os seus defeitos. Assim, necessita de uma contínua conversão, de ter sempre os olhos voltados para Deus, em busca de ser fiel a Deus.

Se a Igreja fosse um organismo puramente humano talvez já não existisse; mas como se funda em Deus e Deus sempre a acompanha, é uma barca que vai navegando, apesar das tempestades que a abalam. Existe o pecado, mas também a graça.

Se não conhecesse a Igreja, apenas confiado no que tantas vezes vai sendo transmitido, quer na comunicação social, como noutros meios, assustava-me, viveria angustiado, a aguardar o que muitas pessoas vaticinam: o seu fim. Mas como a conheço de outra forma, sem negar os seus pecados (e alguns são demasiadamente graves), vejo a Igreja como o Povo que vai continuando a missão que Deus lhe confiou. Vejo isto em tantos e tantos santos que, como um livro vivo, nos vão revelando o caminho para Deus, não só os santos que estão nos altares, mas também aqueles que fazem parte da nossa vida. São homens e mulheres que vivem a santidade, carregando a cruz de Cristo, mostrando o Amor de Deus à humanidade, que inúmeras vezes o rejeita.

Apesar dos tempos difíceis que vivemos, sobretudo neste mundo ocidental, a esperança continua. Se a falta de vocações sacerdotais e consagradas podem-nos deixar apreensivos, o empenho de muitos cristãos leigos, nos mais variados âmbitos, diz-nos que o Espírito Santo está presente, que a Igreja tem futuro, irá continuar a missão que Cristo lhe confiou.

 

Hoje, sentir-se chamado é confiar em Deus, colocar nas suas mãos a própria vida.

Somos enviados a falar em nome de Deus à humanidade. Vivemos numa época em que o mundo se revela complexo, de rápidas mudanças. Hoje, o modo de pensar, de ser de muita gente é diferente de há 25 anos atrás. Os valores propostos pelo cristianismo parece ficarem um pouco à margem do quotidiano de muita gente, surgindo caminhos diferentes, à primeira vista mais apelativos, mais na moda. Perante isto, alguém que é chamado ao sacerdócio vê que necessita de alimentar a sua confiança em Cristo, ciente de que Ele está sempre presente, que não o abandona.

É tempo de o sacerdote compreender que é tempo de semear; a colheita … será quando Deus entender.

 

Falar num episódio que me tenha marcado mais profundamente ao longo destes vinte cinco anos é difícil, diria que impossível. Ao longo destes vinte cinco anos todos os episódios foram marcantes, desde os que me recordo aos que já abraçaram o esquecimento.

Embora não seja capaz de eleger um único episódio, penso que posso recordar-me de alguns em que vejo uma fé viva das pessoas que se encontram a viver circunstâncias muito difíceis, marcantes, diria únicas, da vida. Pessoas que se encontram doentes, padecendo enfermidades de que só escutar o nome já nos assusta, que vivem no meio de dolorosas lágrimas uma confiança total em Deus. Quando estamos com elas, apercebo-me de que nelas se encontra o rosto de Cristo, que a Fé é o alimento, a segurança dessas pessoas. São pessoas que vivem a santidade no silêncio, longe do olhar da larga maioria das pessoas, porém no coração de Cristo.

Posso falar, também, de outras pessoas a quem a vida correu mal, por vezes a nível familiar, famílias desfeitas, que continuam a confiar em Deus, a querer viver uma vida cristã.

Estes e outros tipos de episódios são marcantes, enriquecem-me, ajudam-me a olhar mais para a vida com um olhar mais semelhante ao de Cristo.

 

Para os próximos anos, não faço projetos, a vida há de acontecer com naturalidade.

É hora de recordar o lema que escolhi há vinte cinco anos. Deixar que Deus me envie, a quem ele quiser, esperando anunciar sempre o que Ele quiser, mesmo quando isso se torna mais difícil, na certeza de que estará sempre comigo e de que nas horas em que eu não seja seu verdadeiro rosto Ele servir-se-á das minhas fragilidades para que a Boa Nova chegue às pessoas.

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